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Belo Monte e a jactância autoritária de Lula


Telma Monteiro

Lula esteve em Altamira para “lançar” Belo Monte. Foi acompanhado de autoridades e políticos em campanha. Políticos adoram grandes obras. Campanhas eleitorais no Brasil costumam receber apoio financeiro de empreiteiras e de concessionárias de serviços públicos. Em especial do setor energético onde se vê o desenvolvimento de grupos de poder nacionais e internacionais unidos aos partidos políticos para benefício mútuo.
Para Lula não passamos de medíocres e meia dúzia de jovens desinformados porque não conhecemos o projeto da hidrelétrica de Belo Monte. Compartilhando experiências, disse que quando jovem foi protestar contra a usina de Itaipu.  Na época ele acreditou que Itaipu iria alterar o clima da região, causar terremoto, que o peso da água mudaria o eixo da Terra e que a Argentina seria inundada. É bom esclarecer que tirando a história idiota da mudança do eixo da Terra, os demais impactos acontecem no caso de grandes hidrelétricas. Se ele considera fantasias é por pura falta de conhecimento e não de informações disponíveis.
Ao nos chamar de meia dúzia de jovens bem intencionados e mal informados esqueceu que entre esses [jovens] estão a equipe técnica do Ibama que analisou o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) de Belo Monte, os técnicos e procuradores do Ministério Público Federal (MPF) que se debruçaram por meses sobre o calhamaço de informações do processo, dos especialistas da academia que emitiram seus pareceres, do juiz da Vara de Altamira, Antonio Carlos Campelo, que acompanha o caso desde a primeira ação ajuizada, das organizações da sociedade civil que contam com pessoal habilitado em questões ambientais, dos movimentos sociais da região do Xingu que vivem o dia a dia do rio, dos indígenas que conhecem profundamente o comportamento do ecossistema do qual suas vidas dependem.
Mais uma vez a falta de conhecimento de Lula atrapalha seu discernimento. Quem não conhece o projeto de Belo Monte e não tem paciência para ouvir é ele, apesar de tudo o que já foi publicado e falado a respeito. Em Altamira ele se jactava. Jactou-se de histórias, pseudo-experiências e afirmações que empolgam uma platéia constituída de cabos eleitorais e bajuladores dele e da governadora do Pará. A retórica é o seu velho e gasto artifício utilizado quando precisa fazer cara de paisagem política.
Em se tratando de um presidente que se vangloria de ter chegado aonde chegou sem que fosse preciso ter estudado, não surpreende que tenha desprezado as conclusões de acadêmicos e especialistas.  Pensando bem, quando Lula nos chama de desinformados pode estar se referindo à falta de outras informações sobre Belo Monte, que não estão disponíveis. 
Nesse caso podemos mesmo estar desinformados.  Entre as informações que Lula diz que tem e afirma que não temos, pode estar a estratégia de utilização dos recursos de energia para aumentar sua influência na política regional. Ou a pretensão de ser lembrado no futuro como um estadista que encontrou o ideal da política energética com a exploração da Amazônia. Outra possibilidade seria a de que ele detém as últimas informações sobre áreas específicas de importância relativas ao objetivo de transformar o Brasil na quinta economia global.
O diálogo e o debate não são importantes para Lula e a prova está no seu discurso que ignorou completamente o resto da sociedade.  Embora o engajamento de Lula na construção de Belo Monte seja surpreendente, ele tem explicação. Um país rico em recursos naturais como o Brasil tem tudo a oferecer, hoje, ao mundo, para atrair a cobiça das grandes potências.
Por outro lado, o setor privado brasileiro não quer investir em obras com viabilidade econômica duvidosa, idealizadas por estatais hipertróficas, como se viu no imbróglio do leilão de Belo Monte. Não sendo possível obter taxas de retorno compatíveis com os altos custos sociais e ambientais, deixa-se o investimento, o financiamento e os riscos para o Estado que parece ser rico o suficiente.
O engajamento de Lula na campanha de exploração do potencial energético da Amazônia é uma espécie de espectro pairando entre dois extremos: o de nenhum governo e o de uma ditadura. Claramente esse presidente está incentivando falsas parcerias público-privadas, como no caso de Belo Monte, onde quem banca e corre riscos é só o Estado, com o fim de atingir objetivos políticos específicos e hegemônicos.  Lula quer voltar em 2015 para continuar sua obra. Nada mais.

Comentários

  1. Parabens Telma !!!! Repaginou o blog e continua sintonizada nos abusos das grandes empresas e dos politicos que delas dependem. Quanto aos destemperos do Lula, não são assim tão nocivos, o pior mesmo são os asseclas petistas que agora proclamam a oportunidade e a necessidade do estado de exceção. E a nossa historia de resistencia e combate à direita militarizada e ao estalinismo, que poderia ser encerrada com a confraternização da liberdade de divergencia na democracia, vai ter que encarar agora o "estalulismo" .
    O "estalulismo" consiste em tornar dogmas os principios que estão criando novas instituições como as "reservas energeticas" para subtrair terras e vidas das areas já protegidas, das Unidades de Conservação, das Terras Indigenas e das posses e rios piscosos que pertencem aos milhões de brasileiros que estão sendo expropriados e despossuidos pelos iluminados. E, como fez a Santa inquisição, monitorar, auscultar, perseguir, enquadrar , prender quem criticar e ousar se organizar para resistir. Ainda contamos com alguns bispos e padres, e com Oxossi !!

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  2. Salve Telma! É isso aí..., fizemos até um PROTESTO/PASSEATA, no Rio de Janeiro, com os Índios do Instituto Tamoios do RJ, artistas, professores, amigos e outros irmãos de luta, com o Dakota, liderança indígena dos EUA, alguns funcionários/trabalhadores/técnicos do IBAMA, que estavam em greve, na época, no dia 14 de Maio/2010, e eles afirmaram, que todos os relatórios dos técnicos do IBAMA, foram e são contra a construção de Belo Monte, por diversas irregularidades técnicas e grave nocividade ao meio ambiente da região, rios, leitos, nascente, e afetando 50.000 brasileiros, entre índios e povos ribeirinhos, isso a nossa mídia não informa ao nosso povo brasileiro...é como não tivessem interesse, sei lá o que...mais um absurdo não só do Governo Federal, como também da mídia que fica velada, em cima do muro, sem cumprir o seu papel investigativo, e jornalistico deixando o nosso povo sem as informações necessárias...VAMOS CONTINUAR CADA UM DE NÓS, FAZENDO A SUA PARTE...FORA À HIDRELÉTRICA DE BELO MONTE!!! ENERGIAS ALTERNATIVAS JÁ...EÓLICA, SOLAR, etc...
    Abraço fraterno!
    Nélio Torres / www.neliotorres.com.br

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  3. Infelizmente Lula é isso e muito mais um ser ignorante e sem cultura bastente para entender e cuidar do nosso planeta. Esse é o Lula.
    Segue meu BLOG
    www.edinhosillva.blog.uol.com.br

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