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Belo Monte: a luta dos povos e o desdém do governo

Foto: Telma Monteiro

Nos últimos meses, a batalha contra a instalação da Usina Hidrelétrica (UHE) de Belo Monte tem se intensificado. De um lado, Lula garantiu que o Tribunal Regional Federal (TRF) realizasse o leilão no dia 20/04. O mesmo foi feito sobre a presença de forte aparato policial e com os investidores interessados entrando pela porta lateral da Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL, com medo dos protestos. Um interdito proibitório impedia manifestações num raio de 1 km do local do leilão. 
O governo desprezou os protestos das comunidades do Rio Xingu e as análises do painel de especialistas e intelectuais; desconsiderou a posição do Ministério Público Federal do Pará; ignorou os pareceres técnicos de servidores do IBAMA e as críticas dos movimentos sociais. 
Durante o início da copa do mundo, Lula visitou Altamira para defender Belo Monte. Para impedir qualquer protesto, escolheu um estádio de futebol para realizar um comício, com público selecionado. No mesmo período cerca de 400 manifestantes, entre moradores de Altamira, agricultores familiares e ribeirinhos, fecharam a rodovia Transamazônica na altura do km 18 no trecho Altamira – Marabá.
Sobre este tema publicamos artigo de Dion Monteiro, integrante do Comitê Metropolitano Xingu Vivo Para Sempre.

BELO MONTE: A LUTA DOS POVOS E O DESDÉM DO GOVERNO

Há mais de 20 anos, comunidades indígenas, pescadores, agricultores, extrativistas, populações urbanas, e outros grupos sociais e econômicos, lutam contra a construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu. Após forte pressão social o governo Sarney suspendeu a obra em 1989. Porém, o governo do presidente Lula retomou o projeto em 2005, e agora encaminha a passos largos a construção desta hidrelétrica. Mas por que estes diversos grupos, incluindo ambientalistas e renomados cientistas, lutam há tanto tempo contra esta usina?
Os principais questionamentos feitos por pesquisadores, por moradores da região, e por diversas organizações e movimentos sociais são: nada da energia gerada ficará para as comunidades amazônicas; a energia prometida, de 11 mil MW, só será fornecida durante 4 meses do ano. A média de energia gerada não passará de 4,5 mil MW, o que inviabiliza o projeto economicamente, exigindo a construção de novas barragens, segundo estudiosos da área; mais de 20 mil pessoas serão remanejadas compulsoriamente, porém até hoje não existe indicação dizendo para onde essas pessoas irão; o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) de Belo Monte fala em um reservatório de 516 Km², porém o edital de licitação fala em 668Km², 30% maior que o considerado no estudo; o governo fala que serão gastos aproximadamente 20 bilhões de reais na obra, porém as empresas de engenharia afirmam que o gasto na construção não vai sair por menos de 30 bilhões de reais, colocando novamente em dúvida a efetividade na relação custo-benefício do projeto; o governo estima que 100 mil pessoas migrarão para a região, mas o EIA diz que no pico da obra somente serão gerados aproximadamente 40 mil empregos, entre diretos e indiretos; o governo confirma que 03 terras e áreas indígenas serão afetadas, porém se recusou a realizar as oitivas indígenas, exigidas pela Constituição; a construção da barragem vai fazer com que uma área de 100 Km do rio Xingu tenha a sua vazão reduzida a 30% do normal, afetando a navegação, e a vida de diversas comunidades que dependem do rio.
Até hoje o governo não apresentou resposta a nenhuma dessas questões, preferindo ignorar, desqualificar ou simplesmente tratar com desdém aqueles que têm apresentado esses problemas para o debate. Certamente esta não é a postura que se espera de governantes eleitos para discutir e resolver os problemas postos, a menos que não tenham competência para apresentar as respostas devidas. Esta é a impressão que fica.

Dion Monteiro é economista do IAMAS, e componente do Comitê Metropolitano do Movimento Xingu Vivo para Sempre. Contato: dionmonteiro@yahoo.com.br.

(Artigo publicado na edição de agosto do jornal do SINTSEP-PA. Disponível na versão digitalizada do jornal: http://issuu.com/sintsep/docs/jornal_sintsep_agosto)

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