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Belo Monte: debate deixou de fora as alternativas para substituir hidrelétricas

Telma Monteiro

Estive no lançamento nacional do documentário premiado no Festival de Cinema de Paulínia "À margem do Xingu – Vozes não consideradas", no dia 14 de setembro, em São Paulo. A sala da Matilha Cultural estava lotada e foi preciso improvisar mais uma sala no andar de baixo para acomodar os que não encontraram lugar.

O documentário é excelente. Parabéns à iniciativa da Matilha Cultural e ao Movimento Xingu Vivo pelo evento muito bem organizado.

Depois do filme, um debate com o procurador do Ministério Público Federal do Pará, Felício Pontes Jr. e o professor Ildo Sauer, encerrou a noite. Não há dúvidas que o procurador herói, do MPF, brilhou mais uma vez ao expor os problemas sociais e ambientais que já estão acontecendo com o início de construção da UHE Belo Monte e a falta de infraestrutura do estado do Pará, em especial na região de Altamira.

Para quem não sabe, Ildo Sauer exerceu entre janeiro de 2003 e 24 de setembro de 2007, o cargo de Diretor Executivo da Petrobras, responsável pela Área de Negócios de Gás e Energia.  Atualmente é  diretor do Instituto de Eletrotécnica da Universidade de São Paulo (USP). No debate, ele fez um intróito bastante longo sobre a história de como chegamos a essa dependência de energia. Nós, a espécie humana. Fez críticas e referências à área de energia do governo Lula e não foi claro sobre as fontes alternativas às hidrelétricas, mesmo depois de se confessar comovido com o documentário sobre Belo Monte.   

Ildo Sauer disse que a expansão da oferta de energia elétrica poderia ser feita com hidrelétricas, usinas de biomassa de cana e eólicas.  Praticamente não falou sobre a necessidade de investimentos em eficiência energética, apenas reforçou o fato de que o potencial de energia eólica pode chegar a 300 mil MW. Em momento algum o professor citou a energia solar como uma importante fonte alternativa no Brasil ou o Proinfa. Falou dos tempos de Dilma Rousseff, ministra de Minas e Energia, quando ela criou o novo modelo institucional de energia elétrica, junto com Furnas. 

Em 2002 foi criado o Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica (Proinfa) para incentivar o uso de fontes alternativas e a indústria de equipamentos. O Banco Nacional de Desenvolvimento Social (BNDES) seria o agente financiador de até 70% dos investimentos com juros subisidiados, com carência de seis meses após a entrada em operação comercial, com amortização por dez anos e não pagamento de juros durante a construção. A  Eletrobras ainda gerencia o programa e continua responsável pela contratação dos projetos, que inclui as Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs). Tirando as PCHs, o programa, se bem conduzido, poderia ser bom. Melhor ainda se incluísse a energia solar.  

A lei que criou o Proinfa foi revista, depois, no Decreto nº 5.025, de 2004, já no governo Lula. No entanto, continuou deixando de lado a energia solar porque a Eletrobras considerou  que esses sistemas são de pequeno porte e direcionados às comunidades isoladas. Essa decisão incompreensível nunca foi revista. A quem não interessa usar o potencial de energia solar do Brasil? 

Embora Felício Pontes Jr. tenha questionado seu interlocutor quanto ao atual modelo de desenvolvimento e ao planejamento da demanda de energia no Brasil, Ildo Sauer contou a história que queria contar.  

Comentários

  1. Ildo Sauer é mais um daqueles que conseguem a proeza de falar durante uma semana e não dizerem nada.
    Já o Felício Pontes Jr. é uma esperança o que, para quem luta contra os "grandes", é uma esperança muito boa. Parabéns Telma.

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